segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

CONTRATO DE NAMORO: COMO E QUANDO FORMALIZAR

O que justifica um relacionamento entre duas ou mais pessoas? O afeto ? A segurança ? O medo do futuro ? O dinheiro ?
Todos sabemos que o dinheiro foi criado para ser moeda de troca, um instrumento para facilitar as transações comerciais. Todavia, ele está cada vez mais presente nos relacionamentos afetivos, uma vez que tendemos a pagar não apenas por bens materiais e serviços: pagamos ou tentamos comprar também os aspectos subjetivos de uma relação, como a afeição, o tempo, a culpa, o desejo. E pagamos com dinheiro ou com a retirada dele.
Assim, os relacionamentos se tornam cada vez mais contratualistas:  quanto antes se falar e se definir o uso do dinheiro no início do relacionamento, menos se falará ao final dele, alguns creem.
Entre os vários formatos possíveis de relacionamento, o casamento ainda se mantém como o mais tradicional e que mais segurança patrimonial oferece aos cônjuges. Mas o namoro e a união estável se mostram os formatos de relacionamento mais adotados atualmente entre os casais hétero ou homossexuais, sendo tênue a linha que define um tipo de outro.
Em tese, nossa legislação permite que qualquer relacionamento amoroso, independentemente do tempo de duração, seja convertido em união estável. Não dispondo a lei em sentido contrário, fica exclusivamente a cargo do Juiz a análise da existência dos elementos fáticos para constituir a união estável: se a relação é pública, contínua e duradoura e se o objetivo é a constituição de família.
Em decorrência disso, torna-se cada vez mais popular um documento (contrato) firmado entre duas pessoas que não querem que sua relação seja considerada união estável e, portanto, sofra seus reflexos patrimoniais: o “CONTRATO DE NAMORO”.
O contrato, no formato que o conhecemos hoje, originou-se no final da Idade Média sob a forte influência do capitalismo e da circulação de riquezas e com a valorização da liberdade individual de ajustar, mesmo que observado e delimitado por uma perspectiva social. Assim, um contrato pode ser simplesmente definido como um encontro de vontade das partes, através do qual regulamentam seus mútuos interesses e visam modificar, adquirir ou extinguir direitos.
Para que possuam validade, porém, os contratos devem conter alguns requisitos básicos (tanto subjetivos como objetivos): entre eles a capacidade de contratar, vontade livre e consciente, licitude, determinação e possibilidade física ou jurídica do  objeto e forma prevista ou não proibida em lei. Assim, o contrato pode ter seu formato estipulado livremente pelas partes, desde que a lei não exija forma especial.
Conceituado o contrato e sua forma, importante é entender os dois tipos de relacionamento que o documento tratado no texto pretende distinguir.
A união estável está definida pelas Leis 8.971/94 e 9.278/96 e pelo art. 1.723 do Código Civil, sendo essencialmente exigida para sua configuração a intenção de constituir família. E sempre é bom lembrar que o conceito de “família” foi ampliado, sendo assim reconhecida com base no elo de afetividade que une seus integrantes.  
O namoro, segundo o dicionário Houaiss, é verificado quando “duas pessoas têm um relacionamento amoroso em que a aproximação física e psíquica, fundada numa atração recíproca, aspira à continuidade”.
Assim, o namoro não se enquadra no conceito de entidade familiar, mas é tão somente expectativa futura que daí surja uma família, numa autêntica escalada de afeto, que parte do encontro inicial para se tornar (ou não) um relacionamento mais forte. O namoro é definido tão somente pelos requisitos morais definidos pela sociedade e pelos costumes da época e lugar, não possuindo definições legais.
Sendo semelhantes na inexistência de prazo mínimo e coabitação para sua caracterização, inexistência ou não de relações sexuais, o único requisito para diferenciar um namoro de união estável é a constituição de família. No namoro, não há comunhão de vida, há apenas o objetivo de constituição de família futura, enquanto na união estável esta família já existe, já há uma comunhão plena de vidas.
O namoro não gera direitos e obrigações, enquanto a união estável gera entre os companheiros os deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos, a exemplo do casamento.
O contrato de namoro, então, surge como uma alternativa para resguardar o casal que tem um relacionamento amoroso sem os efeitos (principalmente patrimoniais) da união estável, eis que torna os patrimônios incomunicáveis.
Ainda polêmico entre os doutrinadores do direito, os contrários à celebração do “Contrato de Namoro” o conceituam como “regulador do amor”, afirmam-se céticos em relação à sua lavratura, consideram que até mesmo as relações afetivas perderam a espontaneidade e que originou um verdadeiro “temor ao amor”, que se concretiza pelo medo e falta de confiança entre os indivíduos. Afirmam ainda que este documento não possui valor jurídico algum, a não ser a de declaração de singela relação afetiva. Alguns ainda pregam que o contrato pode representar uma fonte de enriquecimento ilícito, diante da ampla possiblidade de relativização do regime de bens nas uniões prolongadas.  
Já os defensores da existência do Contrato de Namoro o caracterizam como plenamente válido, desde que expresse vontade livre e consciente das partes e não seja firmado para fraudar à eventual partilha de bens – hipótese em que, se confirmada a fraude, o contrato perderá sua validade, aplicando-se as regras da união estável para todos os efeitos. As normas que regem a união estável têm “caráter público e indisponível”, ou seja: não podem ser simplesmente “negociadas” entre as partes.
O Contrato de Namoro pode ser formalizado sem maiores dificuldades: as partes, devidamente identificadas, comparecem a um Tabelionato de Títulos e Documentos e declaram, sob as penas da lei, a expressa renúncia ao interesse de constituir família e o prazo de duração. Ressalte-se que o prazo de duração é requisito indispensável para se evitar a evolução para união estável. Portanto, o contrato deve ser continuamente renovado entre o casal, que assim demonstrarão de forma pública que ainda não há o interesse de constituir família, portanto o namoro ainda não evoluiu para união estável.
Caso o namoro termine antes do prazo previsto, o cartório em que o documento foi lavrado deve ser comunicado, para que seja realizada a devida averbação. Da mesma forma, se o namoro se transformou em união estável, recomenda-se que o casal providencie a confecção da “Declaração de União Estável”.
A ligação amor x sexo x dinheiro ainda rende muitas polêmicas – para alguns, são assuntos tabus – como já foi o sexo, em tempos passados. Entendo que o “falar sobre” sempre é saudável e quanto mais se discorre sobre um assunto menos polêmico ele se transforma eis que, segundo as palavras do psicanalista Jorge Forbes: “[...] As necessidades se resolvem na planilha, mas os desejos, não".

Debora Candida Spagnol
Advogada 







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